Saturday 16 June 2018

Freedom Trail

Num fim de semana ensolarado e quente do verão bostoniano, resolvi fazer a tal da Freedom Trail, ou a Trilha da Liberdade.



Esta atividade é com certeza uma dos "must-dos" de quem vem visitar esta cidade, cuja atratividade, para pessoas fora do mundo acadêmio, para as quais Harvard e MIT são os principais motivos de visita, está fortemente relacionada ao seu papel na história da independência dos Estados Unidos. A Freedom Trail conta parte desta história e aproximadamente 4 kilômetros. Ainda que meu aprendizado tenha sido um tanto superficial, tenho certeza que vai enriquecer minha estadia pelos próximos anos aqui nesta terra.
Para começo da trilha, no qual tive que me descolar de Cambridge, onde resido, até o centro de Boston, resolvi apresentar ao meu cachorro um meio de transporte comunitário, como parte da minha função de expô-lo às mais variadas situações possíveis, com objetivo de evitar futuros ataques de pânico da parte dele. Pegamos um ônibus em Cambridge até a estação de metrô de Harvard. Já no ônibus pude perceber a agradabilidade das pessoas daqui, muito superior a das pessoas da Inglaterra. O motorista perguntou se o Enee não pagaria passagem, e ao ver minha hesitação não demorou a sorrir e dizer que era uma brincadeira. No metrô, não demorou pra que um funcionário viesse ao meu auxílio ao me ver com o Enee no colo tentando colocar mais crédito no meu cartão. Enquanto esperava o metrô, mais atenção foi dispendida ao meu pequeno canino, que mais parace um bicho de pelúcia com vida.
Fiquei com ele no colo a viagem inteira, tamanho o seu desconforto com a situação nova: barulhos novos, altos, cheiros diversos misturados no mesmo ambiente, luz fraca típica de um carro de metrô, túneis, e por aí vai.
Imagino que o seu alívio em ter saído do metrô não durou muito ao ter se deparado com o centro de Boston, com mais barulho, mais cheiros e mais pessoas do que está acostumado a ver. Lá não foi diferente, e logo foi o centro das atenções de diversas pessoas, que o deram água e biscoitos.
Para amenizar a falta que sinto de Londres, resolvi parar num Pret-a-manger e comprar um sanduíche de atum, uma das poucas coisas em comum no menu entre os 2 países, e pus-me a caminho do Boston Common, parque central de Boston, e começo da Freedom Trail.
Haviam bastante pessoas lá, sentadas nas mesas da pracinha dentro do parque, cercadas de vans servido comida e sorvete. Como boa inglesa, sentei-me na grama do parque ao invés da mesa, pois queria fazer um picnic de verdade, onde mesa não faz parte. Enquanto comia, tentava dividir minha atenção entre o ir e vir ao meu redor, e ler sobre o que encontraria na trilha.
Os diversos vídeos compilados num só terão mais informações do que eu serei capaz de escrever aqui, e o site da Freedom Trail (https://www.thefreedomtrail.org) com certeza tem ainda mais, para os interessados nos detalhes históricos e precisão dos eventos. O que relatarei será da minha experiência fazendo a trilha, mais do que a história que a trilha conta.
A história do Boston Common é interessante e lembra a história de muitos parques em Londres, no sentido de qe foi adquirido por alguém de posses num passado remoto, e que em algum momento foi destinado para o domínio público, para que cidadãos comuns pudessem usufruir dos gramados verdes, árvores, e tranquilidade num centro urbano. Se não me engano, um dos motivos pelos quais o dono do Common o passou para a cidade de Boston foi que a região ficou urbanizada demais para o gosto dele, que preferia os lugares mais remotos.
Logo ao lado do Boston Common tem uma igreja de Park Street, fundada no começo dos 1800s. Esta igreja foi cenário de muitos protestos para uma maior justiça social, entre elas a abolição da escravatura.
Eu e Enee no Boston Common
Onde Paul Revere foi enterrado
A mais antiga escola pública do país
Roupa típica da época da revolução
Estátua de Paul Revere
Um dos sites da trilha


A trilha é facilmente seguida através dos tijolos na calçada, que nos guiam a cada um dos lugares de interesse. E junto comigo haviam dezenas de outras pessoas, grande maioria turistas, que estavam interessados em aprender mais sobre a história contada na trilha. Muitos faziam parte de grupos com um guia particular, dos quais eu de vez em quando eu ouvia com gosto as peculiaridades que fazem valer o dinheiro pago, muitos vestidos a caráter com roupas da época da independência.
A próxima parada foi o Ganary Burying Ground, um cemitério criado nos 1600s, onde muitos cidadãos notáveis foram enterrados. Entre eles, Paul Revere, que pelo que eu aprendi foi o principal personagem nesta história toda. Não só nesta trilha, mas nos eventos que se sucedem a independência americana (como a maratona de Boston), ouvi falar deste nome diversas vezes, sempre com muito orgulho. Outras paradas de interessa na trilha são a casa onde Paul Revere morou, em North-end, e uma estátua em sua homenagem em um dos parques.
Cachorro não pode entrar no cemitério, o que é compreeensível, mas como o Enee é pequeno o suficiente pra ser carregado, me deixaram entrar com ele na condição que ficasse no meu colo o tempo inteiro.
Passei pela primeira escola pública dos Estados Unidos, de 1635, onde estudou Benjamin Franklin, e também pelo site do massacre de Boston, o evento que deu início a revolução, quando um dos soldados reais revidou com um golpe com sua arma um homem, por ter proferido ofensas à coroa britânica (ou um dos seus oficiais). Outros homems que estavam ao redor começaram a atacar o soldado com bolas de neve e pedras, ao que outros soldados vieram ver o que estava acontecendo, e começou a maior briga. Obviamente que os guardas armados tinham vantagem sobre os civis desarmados, e a ignorância falou mais altos e acabaram atirando, resultando na morte de 5 pessoas. Paul Revere publicou e circulou um folheto sobre o episódeo, chamando de massacre, que fomentou o descontentamento de muitos com a presença de tais oficiais em Boston. Esta foi uma das maiores sementes plantadas que deu força as vozes contrárias a condição de colônia.
A trilha passou também por Quincy Market, uma área legal do North End, com bastante restaurantes e mercados. Estava cheio de gente, e foi onde parei pra ir no banheiro. Confesso que não foi tarefa fácil enfrentar a fila do banheiro e usar o cubículo com o Enee junto, pois ele queria escapar por baixo da porta.
Foi interessante passar pela Charleston Bridge com o Enee, em direção ao fim da trilha, pois a parte por onde passamos nós pedestres não é de concreto, mas sim de uma estrutura de ferro, com buracos por onde se vê o rio embaixo. A ponte treme, e os carros passando fazem um barulho imenso, coisas nada agradáveis para os caninos. Mas o Enee, apesar de estar tremento de medo, conseguiu cruzar caminhando. Na metade do caminho havia um casal vendendo água gelada (estava o maior calor), e eles ficaram impressionados e encantados com o Enee, e deram gelo pra ele comer.
No outro lado da ponte vi o barco USS Constitution, que foi utilizado em uma das batalhas com os britânicos, e em parte construído adivinhem por quem? Ele mesmo, Paul Revere...
Não fiz questão de entrar no barco, e resolvi ir logo pro ponto final da trilha, Bunker Hill. Entretanto, no caminho até lá eu descobri que estava em Charlestown. A minha orientação em Boston ainda não é das melhores, então só percebi onde estava quando reparei no estilo das casas, que é bem típico daquela área da cidade. Parei num parque bem agradável, que também tinha uma história interessante que eu li na placa, mas que não me recordo mais. Com a idade, a nossa memória fica mais seletiva... O monumento em Bunker Hill marca uma das grandes batalhas com os britânicos, que segundo a história foi a primeira batalha onde os americanos perceberam que haviam chance contra os soldados britânicos, apesar destes últimos terem vencido esta batalha.
USS Constitution
Um parque em Charleston
Bunker Hill

Ficamos cerca de 3 horas fazendo a trilha, e mais uma hora pra voltar pra casa. Pra compensar os meses horríveis de inverno, onde fiquei trancada em casa, resolvi descer umas estações antes e caminhar até em casa. Desci em Davis Square e caminhei até a nossa casa, o que deu mais 30 minutos. A caminhada por Cambridge é sempre muito agradável, e ainda vi um pouco de um jogo de baseball em Danehy Park, a caminho de casa.
Nunca vi o Enee tão cansado. Mal chegamos, ele desabou no chão e dormiu por mais de 2 horas.

Video do passeio: https://youtu.be/iRJT5B-isns

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